Resolvi começar a minha contribuição para o blog da escola contando uma história. Nada que faça estranhar quem me conhece. A escolha foi por uma história pessoal, aquela que me trouxe para trabalhar em 1997 no colégio COC Novomundo. Na época, eu tinha 22 anos e um propósito muito claro: melhorar o mundo. Sabia que a escola era o cenário apropriado para iniciar meu objetivo.
Quando fui chamada para a entrevista, tive a certeza de que estava sendo encaminhada para o lugar certo. A escola me contratou para realizar um trabalho com alunos de 4 a 14 anos de idade, onde os temas abordados seriam questões de autoconhecimento, relações e valores. No espaço de uma aula semanal, eu estaria junto com cada turma. Eram encontros onde não seriam avaliados, não precisavam mostrar seus conhecimentos e sim falar e ouvir sobre suas emoções.
Dá para imaginar a beleza desses momentos ?
Nesses encontros, muito do que era iniciado como conversa, precisava de um cuidado a mais depois. Muitos problemas pessoais começaram a ser detectados. E o vínculo que cada aluno tinha a chance de formar comigo permitia uma conversa sobre qualquer problema que se pudesse enfrentar na escola e na vida.
Estamos em 2017 e os encontros continuam. Isso porque estou numa escola que não tem apenas o interesse em formar alunos academicamente competentes, mas também um ser humano emocionalmente equilibrado. Quando um aluno entra na sala o cuidado é dirigido a ele, o mundo lá fora está lá fora, mas o aluno é ele mesmo um mundo, e quando cuidamos bem dele, é do mundo que estamos cuidando.
Esses encontros criaram uma outra demanda no trabalho que desempenho na escola: Conversas. Assim, sigo com os encontros e com as conversas que as crianças e os jovens me solicitam a fim de solucionar uma dor, ou outras conversas que incentivo que eles tenham para resolver conflitos. Nessas conversas clareza e simplicidade são virtudes. Dedicação e amor são necessários para conquistá-las e preservá-las. Parece tranquilo, mas ser simples e claro pode ser perigoso, nos dá a sensação de exposição. Não sei se já perceberam que conversar é uma arte possível com alguns e impossível com outros, há conversas que fluem muito bem, outras nos perdemos por completo. Muitos adotam a confusão para se proteger, como o polvo que joga a tinta na água para camuflar a fuga. A simplicidade e a clareza podem tocar corações, transformar conceitos e atitudes… O momento da conversa é precioso, um momento raro como só esse pode ser, pois em nenhum outro a pessoa abre algo seu com tanta confiança. E ela o faz para que alguém a compreenda.
No meu dia-a-dia dedico grande parte do meu trabalho com os alunos em aperfeiçoar a arte de conversar. Esse trabalho é de pensamento, faz uso puramente da linguagem, mas poderia ser chamado de artesanal. Artesanal indica a diferença do industrializado, do padronizado, do que se torna generalizado, feito para alguém que não sabemos quem será. Esse trabalho de conversar é destinado a cada um, a cada situação (aluno/professor, o aluno e seu grupo de trabalho, o aluno e seu amigo). E não é aquele artesanal que poderia já estar na feirinha à espera de quem o levasse. Ele só vai ser realizado no momento em que os interessados estiverem presentes, e só será feito com eles.
É muito importante tratar de qualquer assunto trazido pelo aluno. Há assuntos que exigem aplicações de regras, neutralidade, imparcialidade. Outros exigem posicionamentos e princípios, nunca indiferença. É possível dizer que tanto faz gostar ou não de futebol, mas não é indiferente que alguém agrida o torcedor contrário quando seu time perde. Tanto faz comer goiaba ou maçã, mas não pode ser indiferente ver alguém ao seu lado passar fome. Situações que agridem os significados mais importantes que temos não suportam a indiferença, precisam de interesse e cuidado. E aqui no COC Novomundo há espaço para isso.
Artesanal também diz respeito a algo feito com as mãos. Mãos, tais como palavras, podem agredir. Mãos e palavras podem afastar, mas também são elas que aproximam, aconchegam, desfazem nós e fazem laços, mãos e palavras mostram uma direção, mãos e palavras detêm a afobação da pressa e também dão um empurrãozinho, mãos e palavras curam feridas. Quando nos referimos que alguém está em boas mãos, consideramos que ele vai ser bem tratado.
Meu propósito de 22 anos atrás continua sendo o meu sonho de hoje, e posso, sem dúvida, dizer que esse sonho se realiza em cada conversa significativa que acompanho, esse trabalho artesanal, que não consigo realizar sozinha, me faz ter a certeza de que no COC Novomundo há a oportunidade de estar em boas mãos.
Gabriela Gomiero é Psicóloga. No Colégio COC Novomundo atua como professora, psicóloga, orientadora educacional e faz parte da Equipe Diretora.